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01/10/2019

Falta de Estado


Eu, não era sua amiga
Ela, não era minha amiga
Cruzavamo-nos no andar das nossas vidas
Adivinhava-lhe o olhar vazio, disfarçado no sorriso franco com que me dizia, bom dia, ou respondia a um boa tarde, pelo tanto que nos habituamos a passar uma pela outra

Num dia, não sabia nada dela
E no outro, toda a gente parecia saber tudo...
mas nada fizeram
Comentavam, agora, sem pudor

Diziam

- Que era louca
- Que andava por casa como na rua, em roupas justas, apertadas com conceitos de bem parecer
- Que um dia se passou de vez e que saiu à rua como quem vai para o duche
- Que as gentes da terra, de olhos arregalados, a olhavam enquanto ela passava

Terá sorrido, para elas, como me sorria a mim?
Com olhos que não vêem mas sentem?

Alguém que eu conheço, e a conhecia, sabia do inferno, e não teve coragem de intervir

diz que ela:

- Vivia à espera de tudo e nada
- Esperava pelo sorriso do Outono – quando “ele” se ausentava por algum tampo
- Esperava pelo anoitecer e anoitecia à espera – de uma alma libertadora (que não foi ela, e chora, enquanto me diz, ela…)

- Atava a vida com nós de cetim
- Fartou-se de esperar

E que lhe terá deixado escrito que:

- Naquele dia sairia vestida só de esperança
- Não procuraria ruas ou estradas conhecidas
- Não sabia onde iria parar
- Mas sabia que não queria esperar mais

E não esperou

Três dias depois encontraram o seu corpo numa curva do rio
A mão direita fechada
Segurava uma fita de cetim branco

Sem nós.


2007-10-25  violência, obsessão, domínio – até quando?
Por, infelizmente, continuar tão actual hoje, como em 2007, resolvi trazer

***
2019-10-01 
nn(in)metamorphosis


4 comentários:

  1. Boa noite, Noname
    Um texto que ti 3 vezes e me comovi, porque tenho um coração de manteiga. Adoro os seus textos tão reais, onde tanta gente se revê. O quotidiano de uma vida!

    Já não ouvia esta música a algum tempo. Adorei

    Beijos. Boa noite

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  2. A vida é cheia de "desafios`". É sempre bom acreditar que alguém nos pode ajudar... e pode... contudo, apenas para o caso de não poder... se alguém deve tentar... é a própria pessoa... a sociedade vê, sente até, mas pouco se envolve... parece-me e mesmo, muitas das vezes nem "vê" porque talvez se acabe por estar demasiado centrados em nós mesmos ou no que nos está imediatamente próximo...

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  3. Texto maravilhoso, dona no.
    Destes, quero muitos.

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