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04/03/2020

Uma miúda feliz



Ao contrário do que alguns pensam eu sou uma miúda feliz.

E tenho lembranças muito boas de anteontem, ontem, de hoje, e irei ter daqui a um bocadinho.

Lembro, o colo do pai e as gargalhadas pelas cócegas que nos fazia, a mim e aos manos.

Lembro, a cabeleira loura da mãe, e das mãos de fada, que tinha e punha, nos vestidos lindos que nos fazia.

Lembro, de ambos, nos beijos de boa noite, nos ralhetes, e a forma como nos iam passando os valores que achavam, e são, de infinita sabedoria.

Lembro, a praia, sempre a mesma, no mês de Agosto e a 1ª quinzena se Setembro. Onde encontrava os amigos que se viam uma vez por ano, e alguns da escola, que tal como nós, estavam na praia, a mesma praia, ano após ano. E a música no picadeiro, à noite, debitada desde a cabine de som, por um dos irmãos Oliveira Muge, escolhas deste, e dos adolescentes para serem oferecidas à escolhida do grupo.

Lembro, da avó materna, vinda do centro do país em visita, que nos presenteava com colares de alvos pinhões, que mais ninguém tinha, lá por aquelas bandas.

Lembro, um amor platónico de criança, por um rapazito de bicicleta que passava à nossa porta a caminho do trabalho. Namorei-o, um mês ou dois, mas ele nunca soube, na verdade, penso que nem eu soube muito bem.

Lembro, o meu primeiro salto alto, de uns 3cm, verniz cor de beringela, um horror de lindos.

Lembro, de ter pedido para ser baptizada, do dia do dito, do meu lindo vestido branco, e da batina suja do padre

Lembro, de natais. E mesmo que Deus não exista, eu sou-Lhe muito grata por nos dar esses pretextos.

Lembro, de acreditar, que o ano que apenas se iniciava era novo e que tudo seria diferente e melhor.

Lembro, de todos os “perdão” e “obrigado” que nem sempre remetem para uma alegria, mas fazem uma deliciosa compressa quente no coração.

Lembro, do dia em que contrariando o veredicto de oftalmologia, voltei à escola, e depois a trabalhar.

Lembro, do meu primeiro salário e da minha primeira compra, um Tissot automático, pequenino, muito feminino.

Lembro, de uma incrível e única festa-aniversário (que aceitei os meus pais me fizessem) que serviu para me despedir de algumas pessoas que ficarão pra sempre no meu coração.

Lembro, de ombros amigos, de choros compartilhados, de gargalhadas intermináveis.

Lembro, de presentes que nunca poderei retribuir, porque amor não se retribui, apenas se sente.

Lembro, das muitas vezes em que me via em reflexos de janelas, montras, nas pinturas polidas dos carros, observando as mudanças no meu rosto, no meu corpo, e de todos os sorrisos sempre que reencontrava o mesmo brilho no olhar.

Lembro, de tantas coisas que imaginei, de todos os futuros que já inventei, e dou comigo a sorrir com um “quem sabe?” entre dentes.

Lembro, de uma conversa que o meu pai teve comigo, que me tocou a alma e eu nunca mais fui a mesma: finalmente, fui eu mesma.

Lembro de coisas que não têm explicação: Aquele olhar; aquele abraço, aquela música, aquele poema.

Lembro, do primeiro beijo que não foi apaixonado, mas foi melhor (foi roubado) e desse susto que me fez sonhar por noites inteiras. 

Lembro, daquele olhar que primeiro, não entendi, segundo, não acreditei, mas que depois me convenceu de que eu era a mulher mais linda do mundo. 


Lembranças, de anteontem e de ontem. Que me formaram e tornaram uma miúda feliz.

Hoje, bem… hoje ainda não passou a lembrança.  :-)

Lembrando-me de tudo isto e de mim, desafio o tempo, e ponho todas as fichas no próximo instante...


***
2020-03-04
nn(in)metamorphosis



8 comentários:

  1. Todas as fichas... Após todo esse histórico de marcas significativas, esse último parágrafo sintetiza bem o quanto se está de bem com a vida, pronto para o que der e vier.
    Muito bem, Noname.

    Uma excelente semana :)

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  2. A vida é composta de lembranças. Umas boa, outras nem tanto. Mas tudo faz parte e, por vezes, surge aquele sorriso, quando queremos viver um pouco certas recordações

    Votos de um dia feliz.

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  3. Um testemunho para lá de bonito… a vida é feita disso tudo e é bom ter memórias e criar outras tantas…

    Inspirado e inspirador… grande beijinho

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  4. Olá noname, depois de ler estas tuas sentidas palavras, deixo-te um enorme abraço:)

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  5. Que bom Noname que tem todas essas recordações até hoje. Espero que o futuro seja tão ou mais feliz que o passado.
    Abraço

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  6. Ou seja, uma vida resumida de boas recordações. O que já vale a pena continuar a luta! Não é mesmo Non?

    Beijos. Boa noite!

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  7. Olha que isso do jogo da roleta por vezes vicia...miúda!
    Não apostes as fichas todas!!

    Belas memórias, mas vê se mantens esse espírito optimista, mesmo nos dias tristes de inverno, que abominas, aliás, como foi o de hoje...:-)

    Boa noite, Non!!

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  8. Lembranças de uma vida e uma vida feliz. E quando assim é, temos tudo para nunca esmorecer e sermos felizes. Gostei. Beijo grande

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